Ver mais

Falência da FTX e seu impacto na indústria cripto

7 mins
Atualizado por Anderson Mendes

EM RESUMO

  • O que está por trás da falência do FTX Group? Qual seu impacto na indústria de criptoativos?
  • O calcanhar de aquiles do ecossistema cripto. Como o “verdadeiro DeFi” entra nisso?
  • promo

O mercado cripto foi sacudido esta semana pelo colapso meteórico da corretora de criptoativos FTX.

Tendo isto em conta, no artigo de hoje, vamos analisar as principais razões, fatos e consequências que levaram à falência do FTX Group, depois de um crescimento recorde de R$ 32 bilhões em 3 anos.

Breve resumo dos acontecimentos dessa semana

Changpeng Zhao, fundador da Binance, anunciou a decisão de vender uma participação de aproximadamente US$ 580 milhões em moedas FTT, emitidas pela exchange FTX de Bankman-Fried.

O FTX Group é composto pelo FTX US, Alameda Research e mais 250 outras empresas. Relatos de que o braço financeiro da FTX, o Alameda Research, detinha uma parte substancial do FTT em seu balanço, levantaram preocupações entre os investidores. Por conta disso, os clientes da corretora começaram a sacar centenas de milhões de dólares.

Dados on-chain mostraram que a Binance, a maior exchange de criptomoedas do mundo, já havia movimentado US$584 milhões em FTT no dia 5 de novembro, como parte de seus planos de liquidar suas participações. Isso fez com que o token despencasse ainda mais.

Nos dias seguintes, o CEO da FTX afirmou que estava tudo bem. No dia 8 de novembro, a Binance Holdings de Zhao anuncia uma carta de intenção não vinculativa para assumir a FTX.com. 

Agora, a FTX está tentando encontrar US$9,4 bilhões em um fundo de resgate, enquanto o regulador da sede nas Bahamas congelou seus ativos. Este evento impactou fortemente os preços dos criptoativos em geral e pressionou as empresas envolvidas em operações com a FTX e a Alameda Research.

O Bitcoin tocou brevemente a marca de US$15.660, seu nível mais baixo em dois anos, enquanto o token FTT perdeu 90% de seu valor nos últimos 7 dias, e na sexta-feira (11) estava negociado a US$2,34.

Neste dia, o FTX Group publicou no twitter seu pedido de falência, e Bankman-Fried deixou o cargo de CEO.  Por fim, a FTX sofreu um suposto hack que drenou US$ 600 milhões de dólares. Clientes que tinham recursos presos na plataforma relatam que tiveram suas contas zeradas.

Quem acompanha o mercado cripto já há algum tempo, dificilmente viu uma crise de tamanha magnitude na última década. Mas, com certeza, a falência da Mt. Gox deve vir à memória. 

Para quem não se lembra ou desconhece o episódio, a MT Gox, uma exchange de criptomoedas japonesa que chegou a ser a maior do mundo, fechou de maneira repentina suas operações em 2014, quando investigações revelaram que ela havia perdido mais de 850.000 bitcoins de seus clientes. 

Pouco depois, ela entrou com pedido de falência, deixando seus clientes sem saber se poderiam recuperar seus investimentos. Algum tempo depois, as autoridades japonesas acusaram o ex-CEO da exchange, Mark Karpelès, de fraude, por acessar os sistemas da corretora para falsificar dados sobre seu saldo como forma de encobrir um suposto hackeamento.

Coerência entre palavras e ações é algo que passa longe do CEO da FTX

Bankman-Fried, CEO da FTX e fundador da Alameda Research, também conhecido como SBF, sempre viu a blockchain mais como um meio para um fim. Ele entrou no mundo cripto após alguns anos como “quant” da Jane Street, com o objetivo declarado de ganhar o máximo de dinheiro para ganhar o máximo de influência possível. 

Essa seria considerada uma boa motivação no mundo cripto, se SBF não tivesse declarado não saber o que era blockchain quando começou a negociar criptomoedas, e tivesse algum amor pelas ferramentas e protocolos que o tornaram rico.

Ao longo de 2022, Bankman-Fried já tinha perdido o posto de “garoto-propaganda cripto” e se tornado uma das personalidades mais criticadas pelos players ligados à finanças descentralizadas (DeFi), por apoiar o “projeto de lei de Proteção ao Consumidor de Commodities Digitais” (DCCPA), e tecer comentários contra a privacidade digital. 

Embora esse projeto de lei possa trazer uma estrutura legal mais clara em torno de grande parte do mercado, a maioria da indústria cripto se posicionou contrariamente.

Isto porque, ao introduzir um regime regulatório mais rígido para o Bitcoin e outros ativos digitais, ele se aplicaria apenas às criptomoedas, que poderiam ser rotuladas como commodities digitais, e a maioria dos tokens DeFi provavelmente não se enquadram nessa categoria. 

Todavia, para quem estava interessado em endurecer a regulação para o mercado cripto, encontrando-se frequentemente com formuladores de políticas em Washington e até derramando milhões de dólares em campanhas políticas de legisladores no último ano, a coerência entre palavras e ações é algo que passa longe, como veremos a seguir.

Quais erros levaram o FTX Group à falência?

1- Não ser transparente e ignorar os riscos de contágio

Eventos como o colapso da Terra LUNA, o experimento da stablecoin algorítmica, foram tão grandes que levaram uma série de grandes empresas à falência, como Celsius, Voyager, BlockFi, dentre outros. 

A FTX adquiriu todos esses negócios e continuou acumulando déficit.

2 – O token nativo de qualquer empresa ou projeto cripto nunca deve ser usado como garantia

Os preços desses ativos geralmente são muito voláteis para servir como garantia sólida. E na maioria das vezes, esses ativos devem ser considerados no balanço patrimonial com um valor máximo de um dólar

E digo isto porque a Alameda Research, o braço de investimento da FTX, colocou seus tokens nativos com valor de quase US$3 bilhões no seu balanço patrimonial??!!

3 – Os fundos dos clientes nunca devem ser usados para financiar investimentos ou operações

E isto não se trata apenas de uma péssima diligência, mas sim de uma fraude. A prática e a supervisão bancária evoluíram ao longo de centenas de anos para evitar eventos como este. 

Segundo a Reuters, a FTX transferiu pelo menos US$4 bilhões para a Alameda Research, incluindo alguns depósitos de clientes, para sustentar seu braço de investimento após uma série de prejuízos.

Pois bem, todos estes erros da FTX nos levam a discussão antiga sobre a necessidade de exigências legais às empresas que desejam operar como custodiante e corretora de criptoativos.

A urgência de requisitos unificados para os players do mercado cripto

Existem muitas corretoras não regulamentadas, ou operando em certas ilhas ou países com pouca ou nenhuma regulamentação. Mais do que isso, a maioria dos países ainda não possui regulamentação e requisitos unificados para os players do mercado cripto.

Por que isso é importante?

Vamos tomar como exemplo o Blockchain Act Law (TVTG), que é atualmente vista por muitos como uma das estruturas regulatórias mais abrangentes para o mercado cripto, assim como a atualmente na Europa.

Dentre os requisitos impostos pelo Blockchain Act Law, às empresas que desejam operar como custodiante e corretora de criptoativos, existe a exigência de que os ativos do cliente sejam mantidos em contas segregadas (separadas) e nunca sejam usados ​​para fins operacionais. 

No mesmo sentido, é o recém aprovado acordo sobre a supervisão do Mercado de Criptoativos na União Europeia (MiCA), que determina a segregação dos ativos digitais dos clientes pelos provedores de serviços de criptoativos, a fim de que os criptoativos não serão afetados em caso de insolvência de uma corretora. 

Todavia, a regulamentação e os requisitos não são os mesmos em todos os países e o que é obrigatório em alguns lugares, pode não ser em outras jurisdições para empresas que operam lá. E isto é um grande problema. Principalmente se levarmos em conta a demanda crescente do lado dos players financeiros tradicionais para se envolverem com players cripto legítimos. 

Atualmente, a obtenção de todos os registros e autorizações necessários para uma empresa operar como exchange, custodiante e gestor de criptoativos, nas diversas jurisdições é trabalho hercúleo, para não dizer insano.

Onde está o calcanhar de Aquiles do ecossistema cripto?

São as pessoas que tomam as decisões em qualquer mercado – não empresas, organizações ou marcas. A FTX, como marca, era fantástica. No início, além de fluxos de receita sólidos, ela tinha um produto que seus clientes adoravam. Se ela continuasse a fazer o que estava fazendo, continuaria na dianteira do mercado.  

Contudo, em algum momento, alguém da FTX tomou a decisão de emprestar os depósitos dos clientes, deixando de lado a liquidez. Acontece que o Bitcoin e as criptomoedas em geral nunca devem ser alavancados, pelo simples fato de que não podem ser alavancados com segurança.

E qualquer um que pense o contrário, aprenderá uma lição muito difícil. A lição de que “falta de liquidez é a mesma coisa que insolvência”. Aqui, é bom lembrar que o calcanhar de Aquiles (maior fraqueza) da indústria cripto está em precisar provar, constantemente, que seus players a levarão adiante, e que vale a pena investir nela.

Note que nenhuma outra indústria ou mercado precisa provar isto. Por isso, se o ecossistema cripto não tiver mais construtores que extratores de valor, ele falhará. Se não houver mais “gente que faz” do que “atores” desonestos, ele falhará. E o colapso da FTX esta semana é um sério risco, nesse sentido.

Considerações finais

É prudente ter em mente que “nunca” se deve confiar suas criptomoedas a terceiros, sendo a autocustódia pré-requsito para quem deseja investir em criptos. Por outro lado, empresas cripto que reproduzem o modelo das finanças centralizadas (CeFi) estão sujeitas aos mesmos problemas que o Bitcoin, as criptomoedas e as blockchains públicas vieram combater. 

Note que soluções centralizadas não são transparentes, não são confiáveis, e podem ser um grande risco para você.  

Dito de outro modo, o problema não são as criptomoedas ou a tecnologia blockchain em si, mas a falta de regulamentação suficiente dos intermediários financeiros que oferecem criptomoedas, como as exchanges centralizadas (CEXs).

O que levou à falência da FTX também ocorre nas finanças tradicionais (TradFi), com a diferença de que a FTX, e demais empresas  centralizadas do mercado cripto, oferecem serviços em criptomoedas.

Talvez, o que está acontecendo agora com o mercado seja um simples lembrete de que o “verdadeiro DeFi” é o futuro.  

O que quero dizer com isso? 

A indústria cripto precisa focar em soluções financeiras transparentes, que sigam o movimento da Web 3.0, rodem em blockchains realmente descentralizadas, onde você possua as chaves privadas de sua hardwallet, e a propriedade dos seus ativos.

Conhecimento é poder!! Nos vemos em breve!

Trusted

Isenção de responsabilidade

Todas as informações contidas em nosso site são publicadas de boa fé e apenas para fins de informação geral. Qualquer ação que o leitor tome com base nas informações contidas em nosso site é por sua própria conta e risco.

image_from_ios-1.jpg
Tatiana Revoredo
Tatiana Revoredo é membro fundadora da Oxford Blockchain Foundation. LinkedIn Top Voice em Inovação e Tecnologia. Estrategista Blockchain pela Saïd Business School, University of Oxford. Especialista em Blockchain Business Applications pelo MIT. Especialista em Artificial Intelligence & Business Strategy pelo MIT Sloan & MIT CSAIL. Especialista em Cyber-Risk Mitigation pela Harvard University. Convidada pelo Parlamento Europeu para a “The Intercontinental Blockchain Conference”....
READ FULL BIO
Patrocinados
Patrocinados