Visão geral da liquidação voluntária do Silvergate e do colapso do Silicon Valley Bank (SVB) e seus possíveis impactos no mercado de criptomoedas.
A liquidação voluntária do Silvergate
1) Do seu nascimento e entrada no mundo cripto ao anúncio de encerramento voluntário de suas atividades
Fundado em 1988, o Silvergate se aventurou no mercado cripto em 2013.
O banco também operava um negócio de armazenamento de hipotecas, mas anunciou em dezembro que encerraria essa divisão, citando o ambiente de aumento das taxas de juros e a redução nos volumes de hipotecas.
Há duas semanas atrás, o banco descontinuou a Silvergate Exchange Network (SEN), sua plataforma de pagamentos cripto e uma de suas ofertas mais populares.
Essa rede permitia transferências 24 horas por dia entre investidores e exchanges de criptomoedas, ao contrário das transferências bancárias tradicionais, que muitas vezes podem levar dias para serem liquidadas.
Nesse passo, na semana passada, o banco com sede na Califórnia alertou que estava “menos do que bem capitalizado” depois que os depositantes exigiram seu dinheiro de volta, acrescentando que estava avaliando sua capacidade de operar como uma preocupação contínua.
2) Impacto do colapso da FTX no Silvergate
Depois de ser atingido por retiradas de clientes após o colapso da exchange cripto FTX, o Silvergate disse que uma liquidação voluntária do banco era “o melhor caminho a seguir” à luz dos “desenvolvimentos regulatórios e da indústria recentes”.
É bom lembrar aqui que a falência da FTX provocou uma volatilidade renovada nos mercados cripto.
3 ) Negociações do Silvergate com a FTX sob investigação
O Silvergate revelou ainda que estava sendo investigado pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos.
Além disso, promotores federais em Washington iniciaram investigação da empresa e suas negociações com a FTX e a Alameda Research.
Some-se a isto o fato de que em janeiro, três senadores americanos pediram ao Silvergate detalhes sobre sua gestão de risco e FTX.
4) A liquidação voluntária do Silvergate
Na última semana, o banco de crédito norte-americano anunciou que encerraria suas operações. Mas, afirmou que pagará os depositantes e tem empréstimos adimplentes.
5) O que o fechamento do Silvergate representa para o ecossistema cripto?
A perda da Silvergate Exchange Network (SEN) tem um grande impacto para o ecossistema cripto. Isto porque representa mais uma baixa estratégica de infraestrutura para o mercado.
E com mais uma baixa, porque mais de US$ 1 trilhão foi eliminado do valor do setor cripto em 2022, já que o aumento das taxas de juros afeta o apetite por ativos mais arriscados.
Após um rápido crescimento em 2020 e 2021, o Bitoin, de longe a criptomoeda mais popular, caiu mais de 60% no ano passado, pressionando a indústria de ativos digitais. Seu preço ficou abaixo de US $16.000 após o colapso da FTX em novembro, mas desde então se recuperou para cerca de US $22.000.
O colapso do Silicon Valley Bank (SVB)
Na sexta-feira (10), os reguladores da Califórnia fecharam o Silicon Valley Bank (SVB). O banco reportou não possuir diretor de risco nos meses que antecederam o colapso, enquanto mais de 90% de seus depósitos não eram segurados.
Em 10 de março, US$ 42 bilhões em depósitos deixaram o banco e levaram ao seu colapso. O Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC) assumiu o controle, após uma onda de saques em massa dos clientes.
Aqui, um parênteses antes de continuar. Os depósitos bancários de clientes em bancos americanos são cobertos pela Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC), instituição similar ao nosso Fundo Garantidor de Crédito (FGC).
O FDIC cobre até US $250.000 em depósitos. Qualquer pessoa com menos de US$ 250.000 pode recuperar seus fundos. Esclarecido isso, vamos avançar mais um pouco.
1) O grande problema em torno da queda do SVB
O SVB detém depósitos em dinheiro de grandes empresas de tecnologia. No ecossistema cripto, por exemplo, a plataforma de jogos Roblox disse em um documento que aproximadamente US $3 bilhões de seu saldo de caixa e títulos está no SVB.
Há notícias de que empresas têm grande percentual de seu caixa com o SBV, e esse dinheiro pode não estar acessível por muito tempo, o que significa que, estas empresas podem não cumprir suas obrigações de curto prazo.
Isso pode levar a efeitos cascata em vários setores. As empresas que detêm mais de US $250.000 com o SVB não poderão acessar seu dinheiro até uma data futura.
Ora, isso pode levar a liquidação de ativos comerciais para pagar credores, falências e perda de empregos. Isso porque uma empresa inadimplente em seus passivos leva a uma cadeia de eventos.
2) Quais empresas cripto podem ser impactadas pela queda do SVB?
O SVB tinha 50% de todas as startups apoiadas por VCs dos EUA, e muitas delas eram empresas focadas em cripto e Blockchain
A lista dos que divulgaram exposição com o Silicon Valley Bank “até agora” é bastante alarmante:
- Circle – US$ 3.3 bilhões
- Blockfi – US$ 227 milhões
- Roblox – US$ 150 milhões, dentre outras
3) A Circle e sua stablecoin USDC estão em risco?
USDC, a segunda maior stablecoin do mercado, emitida pela Circle, perdeu sua posição em várias exchanges, e sua paridade com o dólar caiu abaixo de 87 centavos na manhã de sábado, de acordo com dados do Coingenko. No momento em que escrevo este artigo, a paridade era de 98 centavos de dólar.
É bom lembrar que a USDC foi projetada para ser negociada exatamente a US$ 1, e que ela possui grande importância para o mercado cripto porque grande parte dos bitcoins e altcoins negociados em exchanges, são comprados com as stablecoins USDC e USDT (Tether).
Ela é lastreada por dólares americanos reais e dívidas governamentais de curto prazo, e está no “centro” do mercado de criptomoedas.
Para se ter uma idéia, a DAI – uma stablecoin emitida pela MakerDAO e que possui mais de 40% de “lastro” na USDC, também teve seu preço afetado pelo contágio da USDC, e chegou a ser negociada abaixo de 88 centavos de dólar.
⎯ Qual a causa do rompimento da paridade?
25% das reservas de caixa da Circle estão no SVB – cerca de US$ 3,3 bilhões. Isto é motivo para preocupação? Em seu Twitter, a Circle afirmou que apesar do ocorrido com a SVB, ela continua operando normalmente.
No final de janeiro, um relatório atestou que as reservas de caixa da Circle estavam em instituições financeiras regulamentadas pelos EUA, dentre elas “Bank of New York Mellon, Citizens Trust Bank, Customers Bank, New York Community Bank, uma divisão do Flagstar Bank, N.A., Signature Bank, Banco do Vale do Silício e Banco Silvergate.”
O mesmo relatório afirmou que cerca de US $9,88 bilhões foram mantidos em todas essas instituições, o que foi atualizado mais tarde para para US $11,4 bilhões.
No momento em que escrevia este artigo, Jeremy Allaire – Co-fundador e CEO da Circle – divulgou uma declaração de que “As operações de USDC da Circle abrirão para negócios na segunda-feira de manhã, inclusive com um novo acordo automatizado através de nossa nova parceria com a Cross River Bank. “
Hoje (13), a Circle lançou um comunicado em seu site, declarando o seguinte:
“Após o anúncio conjunto da secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, e dos reguladores prudenciais americanos, todos os depositantes do Silicon Valley Bank e do Signature Bank, que foi fechado hoje pelos reguladores, permanecerão intactos. O depósito de reserva de US$3,3 bilhões mantido no Silicon Valley Bank, cerca de 8% da reserva total de USDC, estará totalmente disponível quando os bancos dos EUA abrirem na manhã de hoje (13).
Nenhuma reserva de USDC foi mantida no Signature Bank. Como token de pagamento regulamentada, a USDC permanece resgatável 1:1 com o dólar americano.”
4) SVB fez lobby para não mostrar se possuía saúde financeira para resistir a uma crise
Em 2015, o presidente do SVB, Greg Becker, apresentou uma declaração a um painel do Senado pressionando os legisladores a isentar mais bancos – incluindo o seu próprio – de novos regulamentos aprovados após a crise financeira de 2008.
Apesar das advertências de alguns senadores, o esforço de lobby de Becker acabou sendo bem-sucedido.
Naquela época, os registros de divulgação federais mostram que o banco estava fazendo lobby com os legisladores sobre a “reforma regulatória financeira” e a the Systemic Risk Designation Improvement Act of 2015 (Lei de Melhoria da Designação de Risco Sistêmico de 2015) – um projeto de lei que foi o precursor da legislação finalmente assinada pelo presidente Donald Trump.
Em 2019, quando o Federal Reserve propôs regulamentos para implementar a lei de desregulamentação, os vigilantes financeiros alertaram que seus regulamentos sobre instituições da Categoria IV – como o SVB foi posteriormente classificado devido ao seu tamanho e outros fatores de risco – eram muito fracos.
A regra final garantiu que as instituições da Categoria IV “não são obrigadas a conduzir e divulgar publicamente os resultados de um teste de estresse administrado pela empresa”.
Um comunicado à imprensa na sexta-feira (10/3) da Federal Deposit Insurance Corporation observou que, em dezembro de 2022, o SVB tinha US$ 209 bilhões em ativos sob gestão – mantendo-o abaixo do limite de US$ 250 bilhões pelo qual o banco havia feito lobby e se exonerado da obrigação de mostrar se possuía capital suficiente para resistir a uma crise.
Pensamentos finais
A administração Biden anunciou neste domingo à noite (12) que todos os depositantes do falido Banco do Vale do Silício teriam acesso a todo o seu dinheiro nesta segunda-feira (13), aprovando uma intervenção extraordinária destinada a evitar uma crise nos mercados financeiros.
Os reguladores também fecharam o Signature Bank de Nova York ontem (12) e disseram que também estenderão a proteção a esses depositantes.
Mas será que esta intervenção extraordinária será suficiente para evitar um efeito cascata?
Até agora, tudo indica que não. As negociações pré-mercado indicam que a turbulência continuará a engolir ações em bancos regionais à medida que os investidores olham para as participações acionárias no SVB e no Signature Bank e ficam assustados.
A queda nas ações de financiadores como o First Republic Bank mostram que mesmo após medidas de emergência dos reguladores dos EUA, os investidores estão no limite.
As ações dos bancos e seguradoras europeus caíram nesta segunda-feira e as ações do Credit Suisse caíram até 15% para um novo recorde de baixa.
E você? Acha que o lobby feito pelo SVB no Congresso americano contribuiu para sua situação atual?
Conseguiu perceber a relação entre a liquidação voluntária do Silvergate, o colapso do SVB, o efeito dominó da FTX e o aperto monetário pelo Banco Central americano (FED)?
Acha que estamos perto do fim dessa história, ou que ainda há muitos acontecimentos por vir?
Conhecimento é poder!! Nos vemos em breve!
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