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Inteligência artificial tira empregos? Para especialista, ela qualifica

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Atualizado por Júlia V. Kurtz

A inteligência artificial é uma das grandes novidades a emergir do mercado de tecnologia nos últimos anos. Além de prometer uma revolução na forma como nos relacionamos com o mundo, ela certamente vai mudar a organização da sociedade como um todo.

Nesta série de entrevistas, o BeInCrypto está conversando com especialistas de diferentes setores da sociedade para entender como a inteligência artificial vai impactar sua área de atuação. O convidado da semana é Rafael Franco, especialista em Engenharia de Software e CEO da Alphacode, empresa que desenvolve projetos no ambiente mobile.

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Nesta conversa, ele fala sobre o mercado de TI, a influência de novas tecnologias e em quais delas a indústria deve focar nos próximos anos.

  • Como você começou a trabalhar no setor de TI?

Eu sou um profissional da área de tecnologia. Sou formado em ciência da computação com especialização em engenharia de software e trabalhei no mercado de tecnologia nos últimos 20 anos. Eu comecei a minha carreira em uma multinacional e trabalhei muito com o segmento de ecommerce.

Há oito anos, eu fundei a minha empresa para atender e comercio e depois de mais ou menos um ano, nós começamos a receber demandas no segmento de aplicativos no segmento mobile. E naquele momento, fizemos uma análise de mercado, na qual entendemos que o setor de aplicativos tinha muitas oportunidades e que ainda não tinham tantas empresas posicionadas no Brasil.

Então, nós começamos a migrar para aplicativos e nos especializarmos cada vez mais. Hoje, a empresa já desenvolveu mais de 300 projetos nesse segmento.

  • Na área de apps móveis, é muito fácil para uma única pessoa criar um aplicativo que viraliza e se torna extremamente popular. Como é lidar com essa concorrência?

Quando falamos de games, existe um pouco desse cenário. Por outro lado, quando a gente fala de atender empresas e grandes empresas, que é o nosso segmento, essa concorrência quase não existe, porque a grande empresa dificilmente vai querer fazer o projeto dela com um desenvolvedor independente.

E, para cada desenvolvedor independente que cria um game e ganha muito dinheiro é porque outros mil desenvolveram e não ganharam nada. Nós vemos muito a exceção e não a regra.

De maneira geral, o mercado de aplicativos é extremamente competitivo. Todos os anos são publicados milhões de novos aplicativos em todo o mundo.

E todos querem ser o Flappy Bird da vez. Eu vou te falar que é tão fácil quanto ser o novo Neymar!

Mas isso é muito raro. Não é uma constante e, de maneira geral, quando você fala de complexidade de desenvolvimento, um aplicativo é muito mais complexo, por exemplo, do que um site.

Em sites, você tem uma competição muito maior com esse tipo de profissional do que eventualmente um aplicativo. Isto ocorre porque o aplicativo tem um controle de qualidade tanto da Apple quanto do Google.

As empresas aprovam manualmente todos os aplicativos. Então, se você não tiver bom nível no produto que você está desenvolvendo, você não consegue nem se quer publicar. Só aí já existe uma barreira de entrada que limita esse tipo de situação.

  • Nós começamos uma migração para a Web3, que tem a proposta de reduzir os poderes da big techs e aumentar o do usuário final. Como você acha que essa mudança vai impactar o mercado?

Eu já vi diversos casos de projetos, de empresas ou empreendedores, que nos procuraram para desenvolver algum aplicativo que morre no papel. Isto ocorre porque mesmo se o aplicativo for desenvolvido, ele não vai ser aprovado. Ele não vai passar pelas regras e pelo compliance das lojas de aplicativos, o que limita bastante a criatividade.

Um exemplo: atualmente as duas grandes lojas de aplicativos (Apple e Google) proíbem aplicativos de conteúdo adulto. Logo, tudo isso é direcionado para a web. Há outros modelos de negócios, alguns questionáveis, que não podem ser desenvolvidos por causa das regras das lojas.

Tanto a Apple quanto o Google estão prestes a adotar uma solicitação da União Europeia de permitir a instalação de aplicativos de qualquer origem. Isto pode ampliar o mercado trazer novas aplicações.

  • Como você vê novas tecnologias centralizadas, como o blockchain?

Pra mim, isso ainda é uma utopia. No momento, existem poucas aplicações que são realmente descentralizadas. Portanto, elas são coisas praticamente um hobby. Não há nada sério que seja descentralizado e o próprio conceito, de maneira geral, não é novo.

Se você voltar 20 anos atrás, verá que as primeiras aplicações de compartilhamento de MP3, que eram peer-to-peer (P2P), como o Kazaa e o Napster.

A minha dúvida é se teremos, em algum momento, aplicações sérias, aquelas que serão tão populares que todo mundo vai utilizar. No caso de aplicativos descentralizados, eu acho muito difícil, porque alguém tem que pagar a conta. E esse é o grande problema.

Eu sempre fui entusiasta de tecnologias de código aberto e elas sempre tiveram essa dificuldade. Que é justamente não ter quem está disposto a pagar. Pense no lado do executivo: na hora que der problema, ele não vai ter a quem processar.

Portanto, a coisa fica muito, muito obscura e eu não vejo, a curto prazo, aplicações descentralizadas tendo algum tipo de sucesso. É um mercado de nicho.

No entanto, se você pegar o pessoal de tecnologia, aqueles que usam ferramentas inovadoras, todos estão trocando mensagens no Slack. Que é uma aplicação muito parecida com o UNIX de 20 anos atrás. O que tem de descentralizado nisso? Nada.

O metaverso queimou a largada. Eu, por exemplo, comprei um par de óculos de realidade virtual quando começou o hype, acho que foi em outubro de 2021, e, desde então, eu o uso de forma muito esporádica.

Eu vejo o metaverso como um terreno grande. Você olha pra ele e fala “dá pra construir uma cidade muito legal aqui!”, mas isso é só um potencial. No momento, não existe nada.

A prova de que o metaverso queimou a largada é que, hoje, ele não é mais assunto. Pelo contrário. O Facebook enfrenta um problema muito sério por causa disso. Ou ele admite a derrota e abandona ou continua cavando e afunda junto.

Existe potencial? Sim. A ferramenta é interessante? Sim. Mas o desenvolvimento ainda está longe e é difícil de popularizar. Os óculos VR, por exemplo, custam US$ 300. É o valor de um celular médio. Onde está o mercado? Onde está o uso? É isso que gera limitação.

Você pode pegar os óculos e acessar o Instagram, mas se for para olhar isso, eu tiro os óculos!.

Todas as aplicações prometidas pelo Mark Zuckerberg se limitaram a alguns vídeos de divulgação. Onde está a aplicação? É preciso fazer muito esforço para usar o produto.

É mais ou menos como era o iPhone. Ele não era nada especial, mas a experiência era bacana. Os óculos VR são a mesma coisa. É um caminho legal para se desenvolver, mas hoje isso é difícil de dizer se isso vai acontecer. Até porque outras empresas estão basicamente largando o Zuckerberg na chuva.

A Meta precisa desenvolver sozinha. A Apple não está fazendo aplicações. O Google não está fazendo aplicações. Você não tem um ecossistema de tecnologia trabalhando para que isso funcione.

Se, por exemplo, você pegar um iPhone, que é da Apple, pode usar aplicativos do Google, da própria Meta. Você usa apps de diversas empresas e isso torna o ecossistema valioso. No metaverso, a Meta precisa carregar tudo sozinha. Você não tem nem um cliente. E isso é muito pesado.

A pergunta que fica é se a Meta vai conseguir sozinha ou vai ter que abandonar o metaverso.

No caso do Brasil, é ainda pior. O empresariado brasileiro é resistente a investir em inovação. Isso acontece porque o brasileiro trabalha para pagar as contas.

O americano, por outro lado, tem dinheiro sobrando pra queimar, então eles conseguem investir muito em pesquisa. Tanto que as maiores empresas do mundo estão lá. O executivo brasileiro não é assim, mas ele amadureceu. Ele identifica o hype e acha legal, pensa “segura aí, eu preciso vender isso por aqui!”. E eu vi pouquíssimos projetos que querem fazer algo no metaverso.

Não houve demanda, não houve interesse. O brasileiro, de certa forma, espera pra ver o que vai acontecer primeiro no mundo e depois ou segue o hype ou deixa os outros quebrarem a cara sozinhos.

  • Aconteceu a mesma coisa no mercado NFT, com o Brasil lançando vários projetos após a queda do mercado em 2022?

NFT é um negócio que tem um custo técnico de implementação muito menor. Criar uma coleção é mais simples, ou seja, a barreira de entrada não é muito grande quando comparamos com o metaverso.

Neste último, você precisa de muito dinheiro para fazer algo, ou você não vai entrar.  Para criar um NFT, você gasta relativamente menos. Aí é só mandar um release e ganhar mídia espontânea e pronto.

  • Outra tecnologia que não é recente mas que é bastante comentada é a inteligência artificial, ainda mais depois do lançamento do ChatGPT. Como você vê esse hype?

A inteligência artificial, da forma como o ChatGPT a entrega, tente a ser a maior revolução tecnológica desde a invenção do smartphone. É algo que vai transformar completamente a sociedade.

A tecnologia não foi inventada agora, ela só chegou em um ponto em que ela pode ser utilizada pela pessoa comum. E esse é o grande paradigma: quando quem não é do ramo começa a usar.

É nesse ponto que a tecnologia se populariza. Eu não tenho dúvida de que a inteligência artificial vai transformar a sociedade, não apenas o mercado de tecnologia. O meu time de desenvolvimento, por exemplo, já adotou como meta usar a inteligência artificial como co-piloto. Isso vai fazer com que o trabalho seja 30 ou 40% mais rápido

Eu não acredito que a inteligência artificial venha para tirar os empregos de todo mundo. Pelo contrário, ela vai nos tornar mais produtivos.

Outra diferença é que quando eu preciso fazer uma busca, o Google me dá 10 links diferentes. Aí eu tenho que clicar no link e encontrar a minha resposta no meio do texto. Com a inteligência artificial, eu só preciso fazer uma pergunta para ela me dar a resposta. Só isso já aumenta a produtividade.

Essa história de que a tecnologia tira emprego é uma visão idiota. Na verdade, ela qualifica o emprego. Claro, ela tira emprego ruim, mas cria empregos bons no lugar. Essa é a realidade. A tecnologia substitui empregos de baixa qualificação.

Por exemplo, o trabalho de um programador é sentar-se em frente a uma tela e digitar o dia inteiro. É um trabalho quase artesanal. E é preciso corrigir uma vírgula que faltou, um ponto. E é nesse sentido que a inteligência artificial ajuda. Você vai usar a tecnologia para resolver esses problemas.

O ser humano vai se concentrar em trabalhos mais intelectuais e menos braçais.

Ao longo do tempo, nós fomos adotando várias tecnologias e esquece que elas tiraram empregos. Quando você entra em um elevador e aperta um botão, você está tirando o emprego de um ascensorista. É exatamente a mesma coisa: a pessoa que era ascensorista hoje está fazendo outra coisa. E é uma vantagem qualificar, até porque é insalubre alguém ficar o dia inteiro dentro de um elevador. Portanto, você tirou esse cada do elevador e o colocou para fazer outra coisa melhor.

É isso que a tecnologia vai fazer. Não há nada de errado em trabalhar fritando hamburguer na chapa, mas se eu tiver uma máquina que faça a mesma coisa, posso pôr essa pessoa para monitorar essa máquina.

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Júlia V. Kurtz
Editora-chefe do BeInCrypto Brasil. Jornalista de dados com formação pelo Knight Center for Journalism in the Americas da Universidade do Texas, possui 10 anos de experiência na cobertura de tecnologia pela Globo e, agora, está se aventurando pelo mundo cripto. Tem passagens na Gazeta do Povo e no Portal UOL.
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