Confiável

Na era da pseudo-verdade digital, a Blockchain pode resgatar a confiança e a segurança

7 Min.
Atualizado por Luís De Magalhães

A internet vive uma crise de autenticidade e caminha para um precipício inevitável: a Teoria da Internet Morta, onde quase 100% do conteúdo será gerado por Inteligência Artificial.

Segundo o relatório 2025 Bad Bot Report da Imperva, em 2024:

  • 51% de todo o tráfego da internet já foi gerado por bots, superando pela primeira vez o tráfego humano (49%).

Mais da metade do conteúdo da internet já é gerado por automação, sendo 37% conteúdo suspeito ou malicioso criado ou distribuído por bots e IA.

Outras questões como Deepfakes não autorizados, imagens maliciosas geradas por IA e notícias fabricadas se espalham em escala exponencial, tornando cada vez mais difícil distinguir o que é real do que é manipulado. 

O resultado disso é uma certa crise de confiança: as pessoas já estão mais céticas sobre a veracidade das informações online do que há um ano atrás. Uma outra pesquisa estimou em US$ 78 bilhões por ano as perdas econômicas globais causadas por desinformação e fake news – um prejuízo que reflete desde golpes financeiros, fraudes até o colapso de credibilidade em instituições. 

Diante dessa “epidemia” de falsidades digitais, existe uma abordagem que eu acredito ser o antídoto: a tecnologia blockchain. Isso é algo que tenho falado em palestras e painéis há alguns anos. A blockchain está sendo reinventada a cada dia, como infraestrutura para validar autenticidade (verdade) e reputação (confiança) no ambiente digital. 

Em vez de confiar em autoridades centralizadas (Big techs, Plataformas de redes sociais) para dizer o que é confiável, usar registros públicos, imutáveis e mecanismos de consenso aberto para distinguir o que é fato e o que é farsa, me parece ser um dos melhores caminhos no momento.

Como a blockchain ajuda a saber o que é real

Como podemos ter certeza de que uma imagem ou vídeo na internet é autêntico, mesmo que tenha sido produzido por IA. Como saber se ele é real, da empresa, instituição ou pessoa que diz representar? 

A blockchain propõe uma solução pela base: criar um cadastro público de conteúdo digital, onde cada arquivo importante – seja uma foto, um documento ou uma notícia – recebe uma espécie de certidão inviolável. Na prática, isso pode ocorrer via tokens não fungíveis (os NFTs). 

Um NFT funciona como um selo digital único registrado em blockchain, associado a um item original. Qualquer um, em qualquer lugar, pode verificar esse registro histórico de procedência.  Desde seu hype em 2021, a tecnologia ficou um pouco “de lado” nas narrativas maiores de mercado, mas não perdeu sua usabilidade.

Esse conceito de proveniência verificável está se expandindo para além da arte: o Story Protocol – um novo protocolo voltado à propriedade intelectual – tem por idéia registrar e rastrear a evolução de obras criativas (textos, imagens, músicas) em uma blockchain dedicada, fornecendo uma fonte neutra de verdade sobre quem criou o quê e quando. Em tempos de inteligência artificial desenfreada, onde não sabemos se as obras que criamos fazem parte de treinamentos de grandes modelos, esse projeto é realmente algo disruptivo e voltado para o futuro.

Outras iniciativas de alta performance tem se destacado, como a Sui, para armazenar e validar conteúdos em grande escala. Projetos como o Walrus (uma rede de armazenamento descentralizado de dados) e o SEAL (um sistema de gerenciamento de acesso e criptografia) também são exemplos dessa infraestrutura emergente: o Walrus possibilita guardar arquivos volumosos – vídeos, áudios, dados brutos – de forma distribuída e à prova de adulteração, enquanto o SEAL usa técnicas de criptografia avançada e políticas on-chain para controlar quem pode descriptografar e acessar determinado dado. Com essas ferramentas, imagina-se um futuro em que um vídeo jornalístico informativo, por exemplo, possa ser gravado, armazenado e distribuído totalmente on-chain, com garantia de autenticidade e sem dependência de um servidor central passível de hacks, fraudes ou censura.

Além de servir como um tipo de “cartório” do conteúdo digital, a blockchain abre caminho para “mercados da verdade” – mecanismos que usam incentivos econômicos para separar fatos de boatos. Um caso bastante interessamte é o do BitMind, um sistema de detecção de deepfakes construído como uma subnet (sub-rede) da plataforma de IA descentralizada Bittensor. O BitMind incentiva pessoas ao redor do mundo a rodar modelos de inteligência artificial especializados em identificar imagens ou áudios gerados artificialmente. Esses “mineradores” de IA, como são chamados, competem para fornecer as detecções mais acuradas, e aqueles que contribuírem com resultados confiáveis são recompensados com criptomoedas nativas do sistema. Em outras palavras, a blockchain do BitMind cria um mercado aberto de verificação, no qual há lucro em desmascarar falsificações – invertendo o jogo contra quem produz deepfakes. Quanto mais deepfakes circulam, mais os detectores têm trabalho (e potencial recompensa), gerando um círculo virtuoso de melhoria.

Claro que essas soluções tecnológicas ainda soam um pouco utópicas diante das Big Techs e de toda infra estrutura das empresas de IA “tradicionais”.  Garantir veracidade on-chain enfrenta ainda, grandes obstáculos práticos e técnicos. Sistemas de NFT e protocolos de proveniência dependem de uma adoção mais ampla – tanto criadores quanto plataformas de conteúdo precisam aderir para que o público se acostume a checar a veracidade de uma mídia digital. E isso ainda é uma questão.

Entretanto, o diferencial da abordagem via blockchain é sua transparência e capacidade de adaptação coletiva. Todos os registros e regras ficam expostos para auditoria pública; se aparecerem novos tipos de fraude digital, a própria comunidade pode ajustar os algoritmos de detecção ou os parâmetros de mercado via consenso, de forma documentada e aberta. Diferente de uma plataforma fechada, que decide mudanças internamente e às vezes pode até perder a confiança dos usuários, uma solução descentralizada lida com a verdade como um bem comum – sujeito a auditoria contínua e melhorias iterativas à vista de todos. 

Essa dinâmica sugere que, apesar de ainda estarmos no início, a blockchain oferece uma base bastante promissora para recuperar e ancorar a realidade no mundo online.

Confiança: como a blockchain ajuda a saber em quem confiar

Tão importante quanto validar fatos é confiar nas fontes. Na internet atual, pessoas e perfis podem aparecer de qualquer lugar, muitas vezes anônimos ou automatizados, dificultando saber quem é humano e quem merece crédito. Identidades falsas e bots proliferam – estima-se que milhões de contas nas redes sociais sejam inautênticas, inflando audiências e espalhando spam ou desinformação. Mesmo entre usuários reais, a falta de reputação verificável significa que um mesmo indivíduo pode cometer abusos e voltar impune sob outro handle, ou criar bots para seguirem de forma fraudulenta.

Aqui novamente a blockchain busca inverter o jogo, introduzindo padrões de identidade descentralizada e reputação que devolvem ao usuário tanto o controle sobre seus dados quanto a responsabilidade por sua conduta digital.

Uma das frentes mais interessantes além da mais popularizada Worldcoin, que escaneia a íris dos humanos é a de Proof of Personhood – provas criptográficas de unicidade humana. A ideia é garantir que cada pessoa possa ter apenas uma identidade digital legítima, evitando exércitos de bots ou duplicatas controladas por um mesmo operador. Temos também o Humanity Protocol, que aposta na biometria da mão: em vez de escanear o olho, ele usa palm prints (impressão e padrão venoso da palma) para verificar unicidade humana. Seus idealizadores argumentam que a palma da mão oferece uma identificação segura com menor invasão de privacidade que a íris, além de equipamentos mais simples. 

Tanto a Worldcoin quanto Humanity Protocol, representam um novo tipo de infraestrutura de confiança: uma identidade descentralizada vinculada a um atributo físico imutável de cada pessoa, registrada em blockchain. Uma vez que você tenha sua identidade validada, não precisa mais expor seu nome, CPF ou e-mail em cada site; basta usar a credencial digital para provar “sou uma pessoa real e única” e, se quiser, atestar certos atributos (maioridade, país de origem) de forma confiável.

Mas a identidade é apenas o primeiro passo para construir confiança. Saber que uma conta representa um humano não diz se aquele humano é confiável, honesto ou competente. Para isso, entra o componente de reputação. Na blockchain, reputação pode ser acumulada de forma portável e à prova de alterações: suas ações positivas ou negativas ficam registradas em diversos serviços, e você carrega esse histórico consigo, não apenas em uma plataforma isolada. Por exemplo, se você participa de um fórum descentralizado e recebe votos de confiança por boas contribuições, esses pontos de reputação podem ser anexados ao seu perfil on-chain e reaproveitados em outra comunidade ou aplicativo. Hoje, gigantes centralizados como Uber ou Airbnb armazenam internamente as avaliações dos usuários/motoristas; no modelo descentralizado, essas avaliações poderiam viver em uma blockchain pública, visíveis a qualquer novo serviço que você queira usar, sem depender de uma API ou da permissão da Uber. 

Projetos como o Intuition estão criando a infraestrutura para isso. O Intuition se define como um “Git do conhecimento”, uma espécie de gráfico global de informações e reputações curado pelos próprios participantes. Nele, cada usuário pode fazer declarações (“esta fonte de dados é confiável”, “eu possuo tal credencial”, “a empresa X entregou Y resultado”) que são então validadas por outros mediante incentivos tokenizados. Ao permitir que usuários criem e verifiquem claims (afirmações) on-chain, o Intuition transforma confiança em um ativo de primeira classe na Web3 – algo quantificável e intercambiável. Com o tempo, cria-se uma teia de confiança: se muitas pessoas que eu considero confiáveis endossam um determinado fato ou a reputação de um indivíduo, passo a confiar também. Tudo isso registrado em contratos inteligentes transparentes, compondo um grafo de reputação acessível a pessoas e algoritmos. Projetos assim envisionam um futuro onde credibilidade é algo que se ganha e perde à vista de todos, através de um rastro permanente de ações verificadas via blockchain.

Construir sistemas de confiança descentralizada também traz desafios complexos. Um dos obstáculos é evitar que essas novas identidades sejam elas mesmas alvo de fraude ou manipulação. Além disso, muitas dessas iniciativas (Worldcoin, Humanity, Billions, Intuition) estão em fases iniciais, com poucas milhares de pessoas testando, bem longe dos bilhões de usuários da internet mais ampla. 

Embora as blockchains já estejam se tornando “adolescentes”, ainda há um longo caminho a ser percorrido. IA e Blockchain são complementares. Eu, particularmente, não consigo ver um caminho saudável de uma delas, sem a outra. 

Elas necessariamente precisam coexistir.

Estamos no início de uma grande mudança tecnológica, onde o futuro, para que seja seguro, precisa ser “on-chain”.

Melhores plataformas de criptomoedas
Melhores plataformas de criptomoedas
Melhores plataformas de criptomoedas

Isenção de responsabilidade

Todas as informações contidas em nosso site são publicadas de boa fé e apenas para fins de informação geral. Qualquer ação que o leitor tome com base nas informações contidas em nosso site é por sua própria conta e risco.

WhatsApp-Image-2025-05-14-at-20.38.33.jpeg
Luciano Mathias
Luciano Mathias é um dos principais nomes na interseção entre Inteligência Artificial, criatividade e Web3 na América Latina. É Founder da Insula AI — produtora pioneira em filmes por IA com atuação no Brasil, México, Argentina e Estados Unidos — e sócio da TRIO, hub de comunicação focado em IA e inovação. Além disso, é fundador da LBCIA, projeto referência em educação sobre IA aplicada a negócios. Especializou-se em IA pela DeepLearning.AI e em Cripto/Web3 pela University of Nicosia...
LER BIO COMPLETA
Patrocionado
Patrocionado