Sistema da Mastercard permitirá transações feitas por assistentes autônomos com tokens de segurança; avanço tende a mudar hábitos de compra e exige adaptação do varejo a um ambiente mais automatizado
A Mastercard pretende iniciar, até o início de 2026, a adoção de um modelo de pagamentos em que agentes de inteligência artificial poderão realizar compras em nome dos usuários. As transações serão autorizadas por meio de tokens criptografados, substituindo os dados reais do cartão. A liberação inicial ocorrerá na América Latina e funcionará com base em regras, limites e permissões definidos pelo próprio consumidor, garantindo que apenas agentes validados executem pagamentos.
O anúncio surge em um contexto de rápida expansão da automação financeira. A Bain & Company estima que o mercado global de Embedded Finance ultrapasse US$ 7,2 trilhões até 2030, impulsionado pela incorporação de serviços bancários em plataformas não financeiras. A Gartner, por sua vez, projeta que, até 2026, mais de 20% das empresas no mundo utilizarão algum nível de IA autônoma em processos operacionais.
SponsoredPara Luis Molla Veloso, especialista em Embedded Finance e integração de serviços financeiros em ambientes digitais, a entrada de agentes autônomos nos meios de pagamento inaugura um novo ciclo de consumo, no qual decisões de compra passam a ocorrer de forma contínua e programada. “Trata-se de uma mudança estrutural: o usuário deixa de apenas autorizar e passa a delegar. A união entre IA autônoma, tokenização e limites programáveis cria um cenário em que a compra acontece no melhor momento, respeitando parâmetros previamente definidos”, afirma.
Como funcionará o novo modelo
No sistema, o consumidor registra o cartão e estabelece regras claras, como valor máximo por transação, frequência de compras, categorias permitidas, lista de agentes autorizados e limites semanais. As informações sensíveis do cartão não são compartilhadas, sendo substituídas por tokens exclusivos e criptografados. Apenas softwares certificados terão permissão para concluir operações.
De acordo com a Mastercard, a estrutura permitirá funções como agendamento inteligente, reposição automática de itens e compras executadas por agentes capazes de acompanhar preços e condições de mercado. Para Luis, a adoção tende a ser mais rápida em segmentos de consumo recorrente, como supermercados, assinaturas digitais e serviços essenciais.
Impacto sobre o consumidor
A novidade reduz fricções, diminui a exposição de dados sensíveis e automatiza rotinas de compra, mas aumenta a importância de configurações bem definidas pelo usuário. “O modelo é seguro, porém exige atenção constante. O equilíbrio entre conveniência e supervisão será decisivo para evitar gastos fora do planejamento”, ressalta o especialista.
Sponsored SponsoredO que muda para as empresas
Para o setor corporativo, a chegada de agentes de IA aos pagamentos combina oportunidades e desafios. Varejistas, fintechs, bancos e marketplaces precisarão ajustar infraestrutura, processos e estratégias de retenção para operar em um cenário altamente automatizado.
Entre os benefícios esperados estão maior previsibilidade de demanda — já que compras programadas reduzem sazonalidade, abandono de carrinhos e rupturas — e aumento das taxas de conversão, com transações automáticas ampliando recorrência e reduzindo barreiras de decisão. Empresas com APIs integradas, checkouts compatíveis e fluxos tokenizados tendem a fortalecer o relacionamento com o cliente, enquanto a tokenização contribui para a redução de fraudes ao eliminar o uso direto dos dados do cartão.
Segundo Luis, esse avanço exige uma revisão profunda da estratégia de experiência do usuário. “Quando a compra é delegada, o papel do varejista se transforma. A decisão deixa de ocorrer apenas na vitrine e passa para o back-end, dentro do sistema de IA. Quem não estiver preparado para integrar APIs ou oferecer dados estruturados pode perder espaço nesse novo ciclo”, avalia.
Sponsored SponsoredApesar dos ganhos, há pontos de atenção. A dependência de sistemas autônomos demanda transparência e rastreabilidade; empresas precisarão identificar padrões de compras automáticas sem recorrer a abordagens invasivas; e novos fluxos de estorno e atendimento deverão ser criados para lidar com transações feitas por agentes. Além disso, o ambiente tende a intensificar a pressão por preços dinâmicos, já que a concorrência passa a ocorrer também entre algoritmos, não apenas entre estratégias de marketing.
Como empresas devem se preparar
Especialistas recomendam que o setor privado inicie desde já a preparação técnica e estratégica para a chegada plena do modelo em 2026. De acordo com Luis, três frentes são prioritárias:
Infraestrutura de APIs e tokenização
Empresas precisam assegurar que checkouts, sistemas de pagamento e camadas antifraude aceitem tokens em vez de dados de cartão. “Quem ainda depende de integrações legadas enfrentará dificuldades”, alerta.
Dados estruturados e catálogo padronizado
Agentes de IA tomam decisões com base em informações claras. Descrições inconsistentes, preços desatualizados e catálogos desorganizados reduzem a chance de recomendação automática.
Estratégia de recorrência e retenção
Modelos de assinatura, programas de recompra e descontos baseados em frequência ganham relevância, pois se alinham diretamente à lógica dos agentes autônomos.
Para Luis, quem se adaptar primeiro poderá capturar vantagens competitivas relevantes. “Entramos em um varejo orientado por sistemas, não por decisões imediatas. Empresas que oferecerem informação clara, integração eficiente e preços competitivos tendem a se tornar fornecedoras preferenciais dos agentes”, diz.
Riscos e cuidados
A automação também traz desafios regulatórios e comportamentais. Do lado do consumidor, permissões excessivas podem gerar gastos não intencionais, especialmente quando limites não são revisados ou notificações ficam desativadas. Para as empresas, cresce o risco de dependência de algoritmos externos, o que pode ampliar disputas por compras não reconhecidas e exigir modelos robustos de governança para o uso de IA no consumo.
Luis conclui que a sustentabilidade do modelo depende do equilíbrio entre eficiência e responsabilidade. “A inovação avança rapidamente, mas precisa caminhar junto com transparência, supervisão e mecanismos de reversão. Agentes autônomos podem transformar o varejo, desde que operem dentro de limites bem definidos.”