Um leitor procurou o BeInCrypto após ter sido furtado há cerca de 100 metros de um posto da polícia militar, próximo ao terminal rodoviário Tietê. Ele teve seus fundos de bitcoin e ether roubados e disse se sentir desamparado pelas autoridades.
A vítima, que prefere manter o anonimato, teve seu celular furtado por um criminoso de bicicleta, por volta das 22h, do dia 18 de setembro de 2023, na capital paulista.
Até aí, parece um crime corriqueiro na cidade de São Paulo. Mas, não foi. Para a surpresa do leitor, o criminoso tinha conhecimento sobre como acessar carteiras de criptoativos e limpou a sua conta da Binance. O prejuízo foi de 0,28 Bitcoin e 1,5 ETH em apenas 36 minutos.
Como tudo aconteceu
A vítima foi furtada a cerca de 100 metros de um posto da polícia militar, onde foi pedir ajuda e reportar o furto.
“Pediram características do ladrão, uma policial anotou meu CPF em um papel e pediu que fizesse o BO em casa e bloqueasse o celular.”
A policial também disse à vítima que, “Isso sempre acontece aqui na região. É comum.”
Conforme o Boletim de Ocorrência,
“Histórico do BO 1ª Edição criada 19/09/2023 19:27 por Felipe Dias Ferreira Jorge – DELEGACIA ELETRONICA 1 Descrição ocorrência cidadão: Estava localizado na saída do terminal Tietê, no lado oposto da Cruzeiro do Sul (ao lado do Ibis Styles Anhembi, Avenida Cruzeiro do Sul, 1709) chamando um Uber, com o celular na mão e olhando para ele, quando passou uma bicicleta entre mim é a mureta do Ibis (tinha um espaço de cerca de 1,30 metros, nem sabia que uma bicicleta passaria por esse espaço). Logo após passou uma segunda bicicleta e o rapaz me agarrou a mão conseguindo levar meu celular, seguiram na contramão da avenida, corri atrás deles gritando, lembrei que minha bagagem ficou para trás, voltei. Meio de Abordagem: Bicicleta”
No BO eletrônico, há os seguintes dizeres:
“*CASO O CELULAR TENHA SIDO FURTADO/ROUBADO e a vítima utilize internet banking, bem como aplicativos financeiros e comerciais no aparelho, convém entrar em contato com a instituição financeira para adverti-los de possíveis fraudes que possam ser cometidas através do aparelho roubado/furtado.”
No entanto, a vítima afirma que a orientação acima descrita acabou por prejudicá-lo.
Na opinião dele, se a abordagem da polícia fosse outra, como orientar na hora a bloquear e-mails e acesso ao celular imediatamente, provavelmente os danos seriam menores.
A reportagem do BeInCrypto procurou a assessoria de imprensa da Polícia Militar do Estado de São Paulo, que ainda não se manifestou. Assim que o BeInCrypto receber uma resposta, a reportagem será atualizada com o parecer da PM.
Vítima não esperava que o crime atingiria seus criptoativos
A vítima demorou mais de um mês para perceber o furto dos criptoativos. Sua percepção era de que os ladrões iam atrás do PIX, de apps de bancos, mas não dos criptoativos.
A demora para perceber o furto, também pode dificultar a investigação, uma vez que o dinheiro foi pulverizado em várias carteiras.
A reportagem conversou com o Delegado da Polícia Civil, Estevão de Castro. Ele não concorda que o período vá dificultar a investigação, já que a blockchain é totalmente rastreável. O que pode acontecer é demorar para reaver os criptoativos ou nunca os recuperar, se o criminoso não converter em moeda fiduciária.
A primeira orientação que sempre dou é ter dois celulares. É chato, sim é chato e trabalhoso, mas é mais um mecanismo de segurança. Deixe todos os aplicativos de banco, corretoras, carteiras quentes em um celular que fique em casa ou no escritório, explica Castro.
Quem roubar não terá acesso aos dados bancários da vítima. Um telefone teria os aplicativos de mobilidade, conversas do dia a dia – enquanto o outro aparelho em segurança – fica com todos os apps financeiros.
“O usuário também pode ter uma conta digital simples no celular com pouco dinheiro, sem limite, sem cheque especial sem nada, para pagar com PIX”, orienta o Delegado.
Outra recomendação, além de bloquear o celular e todos os apps bancários e financeiros imediatamente após o roubo o mais rápido possível, é nunca usar o mesmo e-mail no dispositivo móvel e plataformas financeiras.
O que diz a Binance
O suporte ao cliente da Binance atendeu a vítima – e usuário -, e explicou que a operação na blockchain feita pelos criminosos foi autêntica.
O criminoso, em posse do celular da vítima, usou os dois fatores de autenticação e verificação de segurança e concluiu com sucesso as retiras dos fundos.
A Binance, se colocou à disposição das autoridades policiais para auxiliar no que for preciso nas investigações. Mas isso não deixou a vítima satisfeita.
“Se qualifica um crime e tenho as provas, mediante isso a Binance não consegue me ajudar?”, questionou o leitor.
Nós levamos o questionamento à Binance. A resposta foi:
A rede blockchain funciona de forma diferente do sistema bancário tradicional. Ela não é controlada por nós, ou por qualquer entidade centralizada. As transações, por esse motivo, não podem ser desfeitas. Eu realmente adoraria poder ajudá-lo com isso, mas transações feitas dessa forma não podem ser desfeitas por conta da natureza da tecnologia blockchain.
Ao ser questionada sobre a recuperação dos fundos, o atendente do chat explicou:
Ainda pode ser possível recuperar os fundos, mas isso envolverá investigação por meio da análise de blockchain previamente mencionada
Por favor, contate a polícia e solicite que eles nos contatem por meio das instruções fornecidas.
Não podemos divulgar os detalhes da investigação em andamento, mas você pode entrar em contato com a polícia para obter atualizações. Observe que apenas agências oficiais de aplicação da lei podem usar este portal; entidades privadas e usuários individuais não podem
Dada a nossa experiência com casos similares, uma recuperação pode ser sim possível, mas dado o tempo desde que a transação já ocorreu, o ideal é que você se dirija a uma delegacia hoje mesmo se possível, orientou o serviço de atendimento ao cliente da Binance.
A assessoria de imprensa da Binance no Brasil também explicou que:
- A Binance realiza um trabalho contínuo de educação e apoio aos usuários, incluindo melhores práticas de segurança. Embora a exchange conduza um trabalho intenso para manter as contas seguras, os usuários têm o poder de aumentar significativamente a segurança de suas contas, adotando ações simples para conferir maior proteção às suas contas. Segurança é um dos principais tópicos abordados nos artigos que a Binance Academy disponibiliza gratuitamente e em diversos idiomas, incluindo português.
- A proteção do usuário e segurança são prioridade para a Binance, que atua em total colaboração com as autoridades para coibir que pessoas mal-intencionadas utilizem a plataforma. A exchange ressalta que tem uma equipe de investigação de renome mundial, com ex-agentes que trabalham em constante coordenação autoridades locais e internacionais no combate a crimes cibernéticos e financeiros, inclusive no rastreamento preventivo de contas suspeitas e atividades fraudulentas.
- Além disso, trabalha continuamente para aumentar a segurança da conta do usuário, e tem diversas funcionalidades neste sentido, como o Binance Authenticator que gera códigos de Autenticação de Dois Fatores (2FA) para verificar suas solicitações ou fazer transações.
- Recomenda que o usuário tome algumas medidas de segurança que são realmente efetivas, como por exemplo, melhorar a segurança da senha, habilitar a autenticação multifator, aumentar a segurança do dispositivo e da rede, monitorar ativamente as contas e relatar atividades suspeitas imediatamente. Neste blogpost, a exchange explica como é possível tomar as medidas adequadas para se defender contra ataques de controle de contas (ATO).
Brasil não tem delegacia de crimes relacionados à criptoativos para pessoas físicas
A reportagem foi atrás de uma delegacia que pudesse instaurar inquérito para investigar o caso, e tentar recuperar os fundos da vítima.
Descobrimos que ainda não existem delegacias especializadas para investigar e combater crimes cibernéticos envolvendo criptoativos de pessoas físicas. Apenas grandes crimes, como casos da Atlas Quantum, investigada na CPI das criptomoedas.
Isso porque o setor é nascente e as autoridades em todo mundo, incluindo o Brasil, estão se especializando para apurar e instaurar inquéritos eficazes para atender a população em geral.
Plataforma Brasileira gratuita é referência global para crimes cibernéticos
Uma das iniciativas que tem ajudado autoridades brasileiras e internacionais é a BlockSherlock. Desenvolvida por Vytautas F S Zumas (Delegado de Polícia Civil de Goiás, atualmente coordena o Núcleo de Operações com Criptoativos da Coordenação Geral de Combate ao Crime Organizado da DIOP/SEOPI/Ministério da Justiça e Segurança Pública), com a colaboração de Ana Paula Bez Batti (PGFN). Batti participou de várias investigações, incluindo a Força-Tarefa com o Cybergaeco (MPSP), representando uma das maiores apreensões em processo envolvendo criptoativos.
A plataforma é gratuita e sem fins lucrativos. É usada para servir e conectar unidades brasileiras responsáveis por investigações de crimes de qualquer natureza que envolvam criptoativos.
Através do site, o usuário, utilizando seu e-mail funcional, poderá solicitar:
(i) Cooperação interinstitucional com o Núcleo de Apoio;
(ii) Lista das Exchanges atuantes do Brasil;
(iii) Material de apoio; e
(iv) Modelos de requerimentos e ofícios.
Além das ferramentas necessárias para um rastreamento de transações envolvendo ativos virtuais, a plataforma BlockSherlock traz uma série de ferramentas OSINT (OPEN SOURCE INTELLIGENCE TOOLS) que auxiliarão o agente público também em investigações em fontes abertas.
A BlockSherlock nasceu em 2020 e é utilizada pelo FBI em mais de 87 países. Virou referência para troca de informações entre servidores e operações envolvendo crimes cripto.
Hoje conta com 900 servidores públicos cadastrados de diferentes setores e órgãos que incluem Polícias Civis, Polícia Federal, Receita Federal, COAF, Ministérios Público Federal e Estaduais e o serviço de inteligência do governo americano FBI entre as entidades que acessam o site para esclarecer crimes cibernéticos.
Inquérito Instaurado
Com a ajuda da reportagem, a vítima encontrou um delegado da Polícia Civil, que abriu e já instaurou o inquérito policial. Atualizaremos a história assim que houver novidades sobre a investigação.
Outra percepção durante a apuração de informações para reportagem é a falta de dados das autoridades policiais sobre a quantidade de crimes cripto no Brasil. Hoje, por exemplo, a Polícia Civil ainda não tem uma estatística oficial desses tipos de crimes.
Enviamos uma solicitação com pedido de dados envolvendo crimes com criptoativos para a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo. Se recebermos as informações, atualizaremos com uma nova matéria.
Você já sofreu algum golpe envolvendo criptoativos no Brasil e teve dificuldade para investigar? Conte para gente. Escreva um e-mail para [email protected] e te ajudamos.
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